terça-feira, 14 de junho de 2016

PERNAS PRA QUE TE QUERO

Pernas, para que te quero!
Inicialmente, peço licença para usar uma exclamação gramaticalmente incorreta, mas que julgo caber aqui. Vamos ver se você concorda.
Pernalta com certeza, peralta também. Garantia eu dou, estendida, sem pagamento adicional. Tímida? Consta que sim, mas costumamos observá-la bem pertinho da casa, de nossa janela e muitas vezes a surpreendemos na varanda. Como disse meu pai um dia desses: “Tem um pássaro preto na varanda!”
Olhos, pernas e pés vermelhos, dorso castanho-esverdeado, pescoço e cabeça cinzentos, peito castanho-ferrugem e o bico é amarelo-esverdeado. Seu canto pode ser ouvido principalmente ao alvorecer e ao cair da tarde e costuma ser um dueto entre os membros de um par, mas nossa experiência garante que esta ave prefere um coro (quase ensurdecedor) com seus vizinhos. Não reclamamos, já nos habituamos. Quando temos hóspedes, a coisa pode pegar para valer e costumamos dizer que ensurdecedor é conviver com buzinas, motores desregulados e freadas bruscas. A natureza não incomoda, basta interagir sabiamente com ela. Negativa poderia ser sua influência, caso acreditássemos na crença popular que seu canto é prenúncio certo de chuva. Estaríamos então flutuando num imenso rio e este artigo não poderia ser publicado, pois são inúmeros os exemplares da espécie que nos rodeiam e cantam sem igual.
Por tudo que já pudemos observar, esta ave é desajeitada e elegante ao mesmo tempo. Sabemos que voa, mas usa as pernas como principal forma de escape, inclusive para fugir das lentes da máquina fotográfica. E confesso que é bastante ágil. Sorte a nossa que a paciência de Árpád é frequentemente recompensada!
Onívoras, alimentam-se de sementes, capim, frutas, larvas de insetos, pequenos peixes e crustáceos, sempre apanhados no chão, entre as folhas da mata ou do brejo, bem como na água rasa. Como as galinhas, ciscam a terra e folhas com os bicos. Um galinheiro repleto de milho e outras delícias facilita bastante encher a pança. Várias vezes pudemos observar nosso galo garnisé afugentando irado a invasora atrás de rango fácil. Uma cena engraçada, pois quando espantada, seu voo, sem o dileto acento, é curto, desajeitado e com as pernas pendentes. E tenho para mim que assim sempre foi, mesmo quando em voo acentuado. E assim sempre será.
Sem dimorfismo sexual, seu tamanho varia entre 35 e 40 cm. É o que dizem as más línguas, mas confesso que jamais conseguimos apanhar um exemplar para tirar a dúvida.
Eis que encerro aqui este caso amoroso entre um lindo exemplar do mundo alado e um casal fascinado pelo que na natureza se encerra. Certos de que ouviremos o canto da saracura-do-mato ao amanhecer, dormiremos o sono dos abençoados.
(por Renate Esslinger / Fotos: Árpád Scerép)

Nenhum comentário:

Postar um comentário